quinta-feira, 26 de março de 2009

Sobre a arte de espichar famílias.


Tenho uma família absurdamente família.
Chamar alguns dos meus tios de "tios" soaria até pejorativo, pois a palavra remete sempre àquela figura distante que aperta as suas bochechas algumas vezes no ano enquanto solta no vento aquele velho "oh, como você cresceu!".

Os meus não são desses. São meus amigos. Ora são meus fofoqueiros preferidos, ora meus hóspedes, ora anfitriões, ora meus pais/mães, ora irmãos caçulas, ora meus melhores companheiros de baladas e carnavais.

Acho o máximo a quantidade de vezes que eles se telefonam, é assunto que não acaba nunca. Me faz lembrar eu mesma com aquelas amigas de colégio, entre os 13 e os 14 anos. Espero ter afinidade e cumplicidade assim com minha irmã num futuro grisalho, porque ultimamente a convivência e os assuntos andam meio rarefeitos.

Claro que nem tudo são flores e que estou à milhas e milhas de ser uma filha, irmã, sobrinha etc ideal. Jamais diria a quem fosse que não são complexas essas relações, mas juro que me esforço para engolir sapos que se não digeridos transformariam-se em estupidez, e juro ainda mais forte que me penitencio muito quando não consigo segurar uma grosseria, ou quando meu mau-humor não me permite sorrir e bater um papo, por exemplo. Almejo melhorar...
Enfim, o fato é que adoro ter esse núcleo familiar meio espichado, que não se restringe à pai-mãe-filhos, sabe?

E se tem algo que reparo mesmo nos outros, é a relação que têm com a família.
Já tive até uma semi-paixonite por um carinha só porque ele tratava a mãe como a Rainha Elizabeth... não que ele não lembrasse um descendente da realeza inglesa, mas isso são outros quinhentos.

Morro de preocupação com os amigos cuja família não é lá muito estruturada, meus ombros serão sempre deles (e aos que quiserem, minha família também). E me desenfreio de dar conselhos àqueles que ultrapassam o que considero um limite digno de respeito aos pais.
Por outro lado, me vem a maior alegria do mundo quando reconheço na família dos amigos, algo da minha. Ganham, de pronto, meu sorriso mais largo e minha maior estima. E já arregaço às mangas pra espichar também o núcleo da amizade.

Não sei ao certo o que me fez parar pra pensar nisso tudo.
Talvez tenha sido porque um amigo do peito perdeu o pai (do peito, também). Naquele momento acre, fez-se doce a presença de tantos amigos que não estavam lá só para acalantar o filho, mas para se despedir do pai que era amigo também. Não estavam lá a oferecer pêsames, mas abraçavam-se pela mesma saudade, pois também perdiam um dos seus.
Ou talvez tenha sido porque outra amiga do peito fazia as malas pra ganhar o mundo e vi nos olhos da mãe dela os da minha: aquele olhar que nos vê de fraldas e carrega exatamente o mesmo tanto de orgulho e de tristeza por termos crescido. Um script de preocupações bobas (já tinha escutado todas!) que se atropelavam só para postergar o silêncio da despedida ou pra impedir que nos peçam para ficar.

Na verdade não importa muito o porquê, mas já que o pensamento me veio, que ele me fique como âncora, e que me venha à tona a cada iminente grosseria ou mau-humor imperdoáveis com esses sereszinhos ultra-especiais que eu amo e cujo sangue eu compartilho.

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