quarta-feira, 17 de maio de 2006

Sobre fotos, favelas e rins.



Semana Santa em Belo Horizonte. Sem família. Sem ovos de Páscoa. Sem almoço especial de domingo... Mas nem tudo está perdido! Tem visita de melhor amiga, vindo de São Paulo e na mesma situação. É deixar as mazelas de lado e curtir a semana, depois de tanto tempo sem encontrar – e os reencontros sempre se transformam em histórias lendárias pra contar.
Primeiro programa:
- Amiga, tenho que ir lá na rádio 98 Fm pegar as fotos (Fotos com o pessoal do Los Hermanos, mas isso é papo pra outro post!), bora comigo???
- Bora, mas tu sabes onde é?
- Eu não, mas a gente descobre né? Vai perguntando, pergunta pro porteiro, pro motorista, pro cobrador, enfim. Sabes que gosto de ti por isso, tu topas tudo (em pensamento: se colar, colou!).
- Então vamo.
10 horas da manhã – a amiga tinha um compromisso meio dia –, rumo a radio até então com um endereço que pra nós não fazia o menor sentido. É na Serra, Rua Dr. Camilo. O ônibus que se devia pegar é o 9106, informação triplamente confirmada (pelo pessoal da casa, pelo porteiro e pelo cobrador do ônibus!!!).
Papo vai, papo vem, são muitas novidades, muita conversa pra se por em dia, e o ônibus subindo, subindo, subindo...
- Moço, onde é que a gente desce pra ir na Rua Dr. Camilo?
- Dr. Camilo? Ah, tem que descer no final da linha.
E o ônibus subindo, subindo e subindo...
Final da linha. Entrada da favela da Serra. Ai, ai, ai.
- Moço, e agora, como é que a gente vai pra Rua Dr. Camilo?
- Olha, acompanhem essa senhora aqui que ela ta indo pra lá.
- Hum. Então ta.
Profecia da amiga:
- Oooolha, não é querer falar, mas tu sabes que quando é comigo tudo acontece né? Esse lugar vai ser longe pra caramba, e aposto que tudo subida pra chegar... E ainda vou cair!
Apreensão.
Seguimos a senhora. Simpática ela. Ia com sua filha pra tal da Rua Dr. Camilo. Até diminuiu o medo. Fomos conversando, ela dizendo que tinha que subir só mais umas duas ruas (ladeiras enooooormes, tudo conforme a profecia), e aí a gente já ia chegar. Menos mal. Se bem que perto de mineiro é um “trem” estranho...
De repente, a filha da senhora que nos acompanhava começa ter umas reações estranhas. Ela explica que a filha tem epilepsia (um ataque epilético no meio da rua, era só o que faltava, não?), mas que está tudo bem(!), ela só precisava ficar um pouco parada e ia voltar ao normal, mas que era melhor a gente continuar sem ela. Ela explica em bom mineirês:
- Ó aqui procê vê. Cês sobe essa rua, quebra pra esquerda e sobe de novo. Aí cês vão ver uma escadin. Pode subir. Quando chegar lá em cima, aí é só perguntar onde é a rádio que já é pertin pertin, certin?
Dia de calor em Belo Horizonte. Sol de meio dia. O compromisso da amiga foi pro beleléu. As subidas eram tortura, ainda mais pra pobre da amiga que estava com seus típicos sapatos de drag queen pra lhe favorecer alguns centímetros. Mas enfim... Chegamos na tal escada.
Ai, meu Deus, a escada! De escadinha não tinha nada. Tava mais pra pagador de promessa de Nossa Senhora de Aparecida. E pior, a escada era o acesso à favela. A rua que procurávamos ficava exatamente do outro lado!
- Moço, tem alguma forma de chegar na Rua Dr. Camilo sem subir?
- Olha, ter tem, mas aí cês vão ter que contornar toda a favela, aí vai ser bem longe... Pode subir, não tem perigo não.
Imagina!!! Se quando é longe eles dizem que é pertin, imagina o que significa quando eles dizem que é longe mesmo... Vamo subir a escada mesmo.
A escada era imensa. Íngreme. Estreita. Casas de um lado e do outro. Subo sem olhar pra trás. Não posso olhar. Morro de pena da pobre amiga e sua plataforma botando os bofes pra fora. Digo palavras de força:
- Vem amiga, já ta chegando. Aqui em cima nem tem mais ladeira...
E só escuto uma voz triiiste, sem viiiida (sem ar!) me responder:
- Amiga, to com dor nos rins!!!!!
Escada ultrapassada. Falta de ar. Dor nos rins. Mais informações. Era só pegar o terceiro beco e ir reto. Beco não é uma boa sugestão quando se está na favela, de fato. Mas o beco tinha uma vantagem. Era descida.
Pra amiga, a profecia se concretizava, tudo acontecia com ela. Descida era pior ainda com seus sapatinhos altos. Tira o sapato, leva na mão e desce descalça mesmo. E com dor nos rins.
A rádio, ao longe já se via. E em frente à radio o que se via no momento era o paraíso: uma parada de ônibus (ponto de ônibus para mineiros!). Era ali que poderíamos ter descido, sem ladeira, sem escada, sem favela, sem ataque epilético, sem dor nos rins. Pegamos o ônibus errado!

2 comentários:

Renata disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Renata disse...

Acho que se morássemos na mesma cidade nossos blogs seriam idênticos. Se mesmo não morando eles já são...